terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Após sonho, gaúcho doa coleção de quase mil peças sobre a Revolução Farroupilha a museu de Piratini

Ao longo de 20 anos, o empresário gaúcho Volnir Júnior dos Santos construiu uma coleção à altura do seu amor pela Revolução Farroupilha. Considerou erguer um museu em Gramado para exibir as 988 peças. Mas, no ano passado, teve um sonho que selou o destino da coleção: o Museu Histórico Farroupilha, em Piratini, a primeira capital da República Rio-Grandense.

— No sonho, os artefatos se perdiam, eu morria e ninguém sabia do que se tratavam aqui no outro Rio Grande (do Norte), então Miguel (Arcanjo) apareceu e me disse "leva para Piratini!" Na manhã seguinte, divulguei meu desejo de doar ao Museu Farroupilha de Piratini — recorda o colecionador.

Empresário de 43 anos que trabalha com locação de imóveis e carros, Santos ainda pensa no Rio Grande do Sul como um "país livre". Natural de São Francisco de Paula, mora em Natal, ou seja, no "Exterior", há 20 anos. Nesse período, tornou-se um exímio conhecedor do movimento farroupilha.

— Eu me considero um novo farrapo, resgatando os pedaços da República Rio-Grandense quando nenhum governo fazia, e futuramente, quem sabe, sendo o governador da secessão.


O desejo de Santos chegou aos ouvidos da diretora do museu, Franciele Domingues. Em 11 de setembro, data em que foi proclamada, em 1836, a República Rio-Grandense, Volnir registrou em cartório a doação. 

Junto à secretária de Estado da cultura, Beatriz Araujo, Francieli viajou até Natal para ver a coleção de perto. A dupla foi recebida por Santos e sua mulher devidamente pilchados, apesar do calor. Na casa, uma bandeira rio-grandense hasteada e a surpresa: 401 quilos de material conservado em condições museológicas e dividido em 29 volumes. Entre as preciosidades datadas de 1835 a 1845 havia espadas, balas de canhão, moedas e documentos, além de itens comemorativos e livros raros de anos posteriores. 

— Eu conhecia a história de algumas peças, mas nunca tinha visto porque eram raríssimas — relembra Francieli, que é historiadora e se emocionou com o acervo. — É um tesouro farroupilha voltando para casa. 

De valor inestimável, o acervo representava mais do que toda a coleção do museu, que possui 600 itens e passará a ter quase 1,5 mil. Fundada em 1953, a instituição não recebia doações desde os anos 1970.

— Nunca tinha visto uma coleção tão grande. Ela conta a história de vida e morte de todo um sonho que se constitui a partir da formação da República Rio-Grandense — reforça a diretora do museu. 

Santos preza todos os itens, mas sublinha a importância de alguns, como o facão (foto com fundo vermelho) de Joaquim Teixeira Nunes, líder dos lanceiros negros que teria sido morto com a própria arma no Massacre de Porongos. Para Francieli, a coleção preenche lacunas na história do Estado: 

— Um documento fala que a província só foi devidamente pacificada em 1847, mostrando que houve tentativas de continuar a guerra mesmo depois de 1845. Já as moedas vinham de outros países e recebiam o carimbo da República de Piratini. Apesar de ser um período de guerra, havia a experiência de República com comércio, indústria e até passaporte para entrar no RS. Nada disso a gente tinha no museu. 

O museu

A volumosa doação impôs dois desafios: como transportar as peças frágeis e como exibi-las. O transporte foi viabilizado com um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) e, em terra, pelo Exército Brasileiro. 

Atualmente, o acervo se encontra em Porto Alegre, onde técnicos da Diretoria de Memória e Patrimônio da Secretaria da Cultura fazem a catalogação. Enquanto isso, o Museu Histórico Farroupilha, que foi contemplado com R$ 100 mil no ano passado, realiza melhorias na reserva técnica e providencia novo mobiliário expositivo e sistema de alarme. 

A coleção recebeu o apelido do seu dono: Coleção TcheVoni. Sua exibição pública está marcada para setembro de 2020, quando o museu também recebe duas pinturas históricas que estão há 11 anos longe da instituição para restauro. 

Santos está contente com a decisão. Para ele, não se trata de um investimento financeiro, mas um projeto de vida. Aliás, nem sabe dimensionar o quanto investiu em tudo. 

— Jamais venderia algum item, tive muitas propostas, mas esta coleção nunca teve preço para mim! Doei tudo porque o Museu "Farrapo" de Piratini é a pedra fundamental da República Rio-Grandense para as futuras gerações.

O Acervo

O quê: acervo de 988 peças reunido ao longo de 20 anos que estava guardado em 29 volumes, totalizando 401 quilos.
Perfil: peças de armaria, livros raros, documentos, moedas e mais.
Origem: Brasil, Estados Unidos, Itália, França, Uruguai, Argentina.
O colecionador: o empresário Volnir Júnior dos Santos, o Tchê Voni, de São Francisco de Paula.

Programe-se

Atualmente em fase de catalogação, o acervo poderá ser visto no Museu Histórico Farroupilha a partir de setembro. O museu é localizado na Rua Coronel Pedroso, 77, em Piratini, e pode ser visitado de terça a sexta-feira, das 9h as 11h30min, e das 13h30min às 17h, sábados, domingos e feriados das 14h30min às 17h.

Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-e-lazer/noticia/2020/01/apos-sonho-gaucho-doa-colecao-de-quase-mil-pecas-sobre-a-revolucao-farroupilha-a-museu-de-piratini-ck5n0mnc001hw01pl8e2q43c3.html


















Coleção conta com quase mil itens, incluindo espadas e livros raros
Tadeu Vilani / Agencia RBS

Uma das raridades da coleção: a primeira edição em francês do livro de memórias de Garibaldi, de 1861
Tadeu Vilani / Agencia RBS


















Arma de Joaquim Teixeira Nunes, líder dos lanceiros negros
Acervo Pessoal / Volnir Júnior dos Santos


















Detalhe de livro técnico que integra o acervo
Rafael Varela / Divulgação Sedac


















Coleção conta com livros relacionados ao tema
Tadeu Vilani / Agencia RBS