sábado, 28 de fevereiro de 2015

Porto Alegre - Patrimônio Resgatado

Moradores da Zona Sul querem trazer de volta à capital parte do antigo trenzinho da Tristeza, hoje abandonado em Carlos Barbosa.

Um pedaço da história da zona sul de Porto Alegre saiu dos trilhos e foi parar na Serra. E os moradores querem resgatá-lo. Em 2012, depois que o arquiteto André Huyer publicou o livro A Ferrovia do Riacho, parte de sua pesquisa de mestrado em Planejamento Urbano e Regional pela UFRGS, a comunidade deparou com um passado quase esquecido.
A obra trata da locomotiva que ligou a Zona Sul ao Centro Histórico e impulsionou o desenvolvimento da área mais austral da Capital. Quando souberam que parte desse trem, chamado de Trenzinho da Tristeza, estava à mingua na cidade de Carlos Barbosa, lideranças comunitárias trataram de abrir caminhos para trazê-lo de volta. A máquina foi cedida ao município serrano pelo Museu do Carvão, em Arroio dos Ratos. A ideia era transformá-la em mais um atrativo turístico na cidade, mas acabou abandonada.
— Essa locomotiva teve um papel muito importante no desenvolvimento da Zona Sul, representa a nossa história. Os mais idosos andaram nela — diz Anadir Alba, conselheira da Região de Planejamento 6 do Orçamento Participativo, à frente da “operação” de resgate do trem.
As perspectivas de o que sobrou do trenzinho voltar para o bairro Tristeza são boas, mas o caminho não passa apenas pela vontade dos moradores. Um grupo de Carlos Barbosa quer que o equipamento permaneça na cidade, ainda que a prefeitura já tenha demonstrado interesse em devolvê-lo, porque é alvo de um inquérito civil público desde 2012 que exige a restauração da máquina. Há mais de cinco anos, o município fez um orçamento dos custos para recuperação e chegou ao valor de R$ 300 mil, sem contar gastos para mantê-lo.
— É um custo muito alto para o município. Não se pode pensar só no hoje quando se fala em patrimônio. É preciso ter recursos para manutenção e, atualmente, não temos. Mesmo que não seja algo diretamente ligado à história de Carlos Barbosa, a gente gostaria de ver recuperado. Por que não passar para quem se interessa em dar uma destinação correta? — questiona a diretora jurídica da prefeitura de Carlos Barbosa, Elda Bruttomesso.
As pretensões dos moradores da Zona Sul têm a colaboração da legislação. O termo de cessão de uso da máquina já expirou. Também não há nenhuma lei formal que tenha autorizado o recebimento do trem como doação, praxe nesse tipo de transação. Assim, a prefeitura de Carlos Barbosa poderia devolver o equipamento sem precisar de aprovação do Legislativo.
Mas para que o trenzinho retorne a Porto Alegre, a prefeitura ou alguma entidade precisa se comprometer em recuperá-lo. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) encaminhou um ofício à Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre para saber a posição do município quanto ao assunto. Na sexta-feira, o órgão confirmou o recebimento do documento e informou que a questão seria repassada à Coordenação de Memória Cultural para avaliação.
Enquanto isso, os moradores da Zona Sul se mobilizam para criar as condições para o futuro monumento. O primeiro passo é conseguir recursos para garantir o transporte do trenzinho de Carlos Barbosa até a Capital. O equipamento enfeitaria a Praça Comendador Souza Gomes, a Pracinha da Tristeza. No auge de seu funcionamento, era ponto de embarque e desembarque de passageiros que buscavam refúgio nos ares ainda rurais da região.
— O negócio é trazer. Quando isso estiver decidido, vamos fazer acontecer — diz Anadir.
Da glória ao declínio
Primórdios
A Ferrovia do Riacho foi concluída em 1899 e o objetivo principal era garantir o transporte do lixo do centro de Porto Alegre para ser despejado no Guaíba na área próxima de onde hoje está a Fundação Iberê Camargo. É que as casas no Centro não tinham banheiro, e os dejetos eram depositados em uma espécie de barril, os chamados cabungos.
Passageiros
O transporte de passageiros pela Ferrovia do Riacho começou em janeiro de 1900. O início da linha era a Estação do Riacho, na foz do Arroio Dilúvio, seguindo pelo bairro Tristeza, naqueles tempos habitado por famílias que viviam da horticultura, viticultura e vinicultura.

Ampliação
Em 1910, começou a obra de prolongamento da ferrovia até a Pedra Redonda, trecho que tinha como obstáculo a abertura de uma fenda em pedra granítica. Foram escavados 6,4 mil metros cúbicos na rocha.

O fim
Com a concorrência do transporte rodoviário, a Ferrovia do Riacho encerrou o transporte de passageiros na década de 1930 e terminou definitivamente com as atividades em 1941, quando a enchente que assolou a Capital destruiu parte da linha.

Sem destino
Antes de parar em Carlos Barbosa, parte da locomotiva da Ferrovia do Riacho esteve em exposição, na década de 1960, no Parque da Redenção, em Porto Alegre. Foi depredada. Depois, em 1986, a dona da máquina, a Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFFSA), reformou-a e a enviou ao Museu do Carvão, em Arroio dos Ratos. A locomotiva foi cedida a Carlos Barbosa porque, inicialmente, pensou-se em recuperá-la e torná-la um atrativo turístico. Fonte: A Ferrovia do Riacho — Do Sanitarismo à Modernização de Porto Alegre, de André Huyer

Por Bruna Porciúncula- bruna.porciuncula.com.br
Castigada pela intempérie, estrutura precisa de reparos urgentes para se tornar um monumento. Foto: Reprodução / Reprodução
A estação férrea da Pracinha da Tristeza por volta de 1920. Foto: Reprodução

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