Deixo claro no começo: é um texto desabafo. Meu desabafo
e de mais ninguém. Assino cada palavra dele, cada vírgula que coloco no
lugar errado e cada posição que vai sendo construída por essas mesmas
palavras e vírgulas minhas.
Eu sou grato à Lina (1). Às vezes as pessoas me
perguntam porque eu escolhi ser arquiteto e nunca respondo a mesma
resposta porque, na verdade, ela vai sendo construída todo dia, de um
jeito estranho, meio caótico, meio sem certezas mesmo. Mas sei que ela,
se não foi a responsável, é um alento para eu ver que tenho que
continuar.
Quando pequeno fui ao Masp (2) e lembro-me
de tê-lo visto como se estivesse vendo o mar pela primeira vez. Era o
mesmo impacto, a mesma vontade de chorar e de rir, o mesmo
deslumbramento, encanto, surpresa. Não tinha cheiro de sal, não tinha o
ar molhado que cola na nossa pele, nem a areia fina que vai massageando a
sola do nosso pé. Mas tinha um piso inteiro com quadros voando colados
em vidros e tinha aquele vazio gigante embaixo do prédio, imenso,
sem fim como o mar em cima da minha cabeça. Era um outro horizonte, o
horizonte que vinha do céu, o horizonte cinza do concreto de uma cidade
também cinza que se abria para mim.
Acho que nunca mais vou esquecer aquele piso
emborrachado, aquele salão sem fim e aquelas obras que dançavam a dança
mais legal que já vi. Porque para mim o Masp é mais do que um bom
acervo. É um espaço experimental, onde eu encontro gente de todo tipo.
Embaixo do mesmo teto. É onde vejo (via, infelizmente) Van Gogh
(obrigado Marjolijn por me ensinar a falar certo o nome dele) do lado de
Monet, do lado de Anita Malfatti, do lado de Modigliani, do lado de
Degas, do lado de Portinari, do lado de Di Cavalcanti. Todos do mesmo
lado, todos vistos hoje porque é assim que é.
o Masp a gente vê (via) a arte feita ontem (e tudo que não é hoje é
ontem sendo ela de dez, 50, 1.000 anos atrás) toda junta. E toda
misturada porque nossa cabeça é assim. A história é assim, a criação é
assim. Sempre fico assustado e simplesmente não compreendo quem fala que
para apreciar uma obra de arte é preciso uma certa neutralidade em
volta para compreendê-la de fato. Assustado porque, louco que sou, fico
pesquisando fotos de ateliês de artistas e vejo que todos eles,
absolutamente todos, pintavam em ambientes carregados e lotados de
interferências. Tinha cachorro do lado, garrafa de café, música tocando,
carteiro chegando. A criação não é asséptica e acho que Lina tinha
total razão de nos mostrar que a visualização dela também não deveria
ser...
Continua o texto no link: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/07.081/4969
Museu de Arte de São Paulo – Masp. Arquiteta Lina Bo Bardi - Desenho de Antonio Fabiano, junho 2010
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