Há mais influências arquitetônicas entre a Cidade Alta e o Porto de
Salvador do que pensam os que não têm olhos para a beleza do Comércio. E
todas essas influências ganharam forma de belos prédios e casarios por
estarem nos arredores do porto, por onde transitou a riqueza (e ainda é,
em parte, assim) não só de Salvador, mas também da Bahia. Marcando
épocas e ciclos econômicos, as influências de ingleses, italianos,
alemães, franceses e até mouros, sem contar os portugueses, claro,
fizeram do Comércio de Salvador uma miscelânea arquitetônica ainda pouco
valorizada.
Os portugueses inauguraram a mistura de estilos dos prédios do
Comércio. Os colonizadores, no entanto, trouxeram diferentes formas de
construí-los. Entre os prédios que marcaram as primeiras povoações de
uma área em que o mar adentrava mais profundamente no continente do que
se vê hoje (graças aos seguidos aterros), existiram os casarões, por
exemplo, no estilo “Pombalino”. São feitos com paredes mais grossas,
numa busca por resistência, que não deixou de privilegiar também a
beleza.
O interessante dos casarões dessa fase é o motivo que gerou a ênfase
na resistência das construções. Eles marcam a época da reconstrução da
parte baixa de Lisboa, que foi destruída por um terremoto em 1775. O
nome Pombalino è uma referência ao Marques de Pombal. Os sobrados que
marcam essa influência podem ser encontrados próximas ao Elevador
Lacerda, abrigando casas comerciais e moradias, estando quase todos em
péssimo estado de conservação.
O estilo inglês de arquitetura foi explorado num dos períodos de
maior pujança da economia baiana. Um dos prédios que demonstram não só a
beleza desse estilo, mas também o destaque dado à imponência de suas
construções é a sede da Associação Comercial da Bahia, cuja obra foi
concluída em 1816. Naquela época o mar ainda chegava bem próximo do
prédio, a alguns metros de suas portas.
Os franceses também deixaram sua marca no Comércio. Uma de suas
escolas arquitetônicas, conhecida como Rococó, que surge na capital
baiana entre os primeiros 50 anos do século XIX, tem belos exemplares na
zona portuária. Um dos bons exemplos do estilo arquitetônico
caracterizado pelas cores leves, alegres e elegantes, que foi um
contraponto ao barroco (para alguns, somente um subproduto do barroco,
com seu estilo pesado e escuro, representando apenas o final do seu
período de influência) é a Casa Cabloca, na Rua dos Ourives.
A arquitetura alemã, por sua vez, deixa a sua principal marca ao
redor do porto de Salvador no início do século passado, com a sede do
Instituto do Cacau. Suas linhas retas, fachadas com cantos arredondados,
basculantes fixos e uma aerodinâmica do estilo modernista, representam o
expressionista germânico.
Um exemplo de arquitetura dos mouros (islâmicos do nordeste da
áfrica) esta expressa em um dos prédios mais destacados do Comércio, a
sede da Capitania dos Portos. Fato interessante sobre o prédio é que em
seus primeiros anos foi também um local onde se construía naus, o que
vai de encontro ao conhecimento popular que indica a Ribeira como único
local de construção de embarcações na cidade.
Essas e muitas outras informações sobre a arquitetura que surge em
torno do Porto de Salvador, estará disponibilizada em um livro. “Tesouro
do Comércio – História e Arquitetura da Zona Portuária de Salvador” é
uma das ações da Companhia das Docas do Estado da Bahia (CODEBA) que
fará parte das comemorações do centenário do Porto de Salvador.
O livro será lançado na próxima segunda-feira, 13 de maio, o mesmo
dia em que o porto foi inaugurado cem anos atrás. A cerimônia, que
contará com a presença de autoridades das administrações estadual e
municipal, ocorrerá às 18h, na sede da Associação Comercial da Bahia.
O livro é ilustrado com fotos de Sérgio Pedreira e tem texto do
jornalista, e colunista da Tribuna da Bahia, Jolivaldo Freitas. Para
Freitas os três meses de pesquisa, em que coletou informações sobre as
edificações do Comércio foi um exercício prazeroso. “Sou um dos maiores
admiradores daquela área da cidade e saber mais detalhes sobre sua
história foi um prazer, principalmente, quando as fontes foram os
antigos comerciantes que até hoje labutam na região”, disse.
O envolvimento de Freitas com a área portuária de Salvador fica claro
no texto do livro que leva o nome de “Os oitizeiros do Comércio”. Nele,
o também escritor descreve imagens de sua infância que impregnaram sua
memória ao vivenciar a região com olhos de admiração. Ele conta, por
exemplo, o quanto era interessante descer e subir num Elevador Lacerda
cujas cabines não eram totalmente fechadas. “Nós, meninos, adorávamos
ficar olhando pelos vãos, no estilo quadro a quadro, enquanto o elevador
subia. A Praça Cayru ficando distante, e o povo – até os marreteiros
vendedores de remédio de verme – tornando-se pequeno até parecer
formiga.”
No mesmo texto, ele conta ainda ter na memória gustativa o sabor “dos
oitis maduros caídos do pé das dezenas de árvores que delineavam e
protegiam a velha Praça Cayru”. Seu amor pela região era tanta que ele
revela que, quando garoto, seu sonho era ser, “quando crescesse, office
boy do Baneb, Econômico, da Aliança da Bahia, do Banco Nacional da
Bahia, da Böhler Welding Group ou estafeta dos Correios ou da Western”.
Apesar de conhecedor, e ativistas pela revitalização, do Comércio,
Freitas encontrou, durante a pesquisa que fez para o livro, muitas
informações que lhe trouxeram surpresas. “Fiquei sabendo, por exemplo,
da importância dos trapiches durante os anos antes da construção do
atual porto. Eles faziam as vezes de mercados, para onde a população se
dirigia em busca de uma grande variedade de mercadorias”, conta.
Ele lembra que um dos mais importantes deles tem uma história
trágica. “Foi o Trapiche Querino, um dos maiores entre o século XIX e
XX. As chuvas, como acontece até hoje na cidade, provocou o deslizamento
da encosta vizinha ao prédio. Houve mortes e a necessidade de
reconstruí-lo”, conta.
Outra descoberta que lhe surpreendeu, foi saber que o Quartel do
Grupamento dos Fuzileiros Navais, na Avenida da França, foi construído
para ser uma base de apoio dos destroyeres (navios de guerra) aliados
durante a segunda guerra. Tinha, inclusive, um nome estrangeiro.
Chamava-se Base Baker, e foi construído com dinheiro dos norte-
americanos.
Tanto o livro “Tesouros do Comércio”, quanto os textos que tem
escrito em diversas mídias sobre a área portuária de Salvador alimenta
no jornalista o sonho de vê-la revitalizada e ter reconhecido pelo
Brasil e pelo mundo, a sua beleza. “Tenho certeza que vai acontecer e
vai ser provado que temos um dos centros antigos mais belos do mundo,
comparável aos de Madrid e Buenos Aires. A área portuária de Salvador,
uma vez revitalizada, será mais bonita, por exemplo, que a de Lisboa”,
prevê. Por Carlos Vianna Junior
Fonte: Tribuna da Bahia
Fonte: http://defender.org.br/2013/05/11/livro-mostra-as-riquezas-da-arquitetura-na-area-da-cidade-baixa-em-salvador-ba/
A arquitetura secular encontrada na Cidade Baixa é destacada no livro.
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