domingo, 21 de abril de 2019

Fotógrafa conta experiência de imersão na Catedral de Notre-Dame

Lisa Roos passou 15 dias registrando imagens do templo consumido pelo fogo na última segunda-feira. Fotos compuseram exposição apresentada em Porto Alegre em 2014.

Notre-Dame de Paris, 2013. Esse foi o título da minha exposição de fotos, ocorrida em 2014, após um convite do dramaturgo e diretor da Cia. de Teatro Novo, Ronald Radde (in memoriam), para participar do projeto O Corcunda de Notre-Dame, adaptação do texto de Victor Hugo, que ficou em cartaz no Teatro Novo DC no mesmo ano. Fui a Paris, junto a alguns integrantes da companhia, para fotografar e vivenciar a catedral, assim como outros locais da cidade relacionados, como a casa onde Hugo viveu.

Parecia um convite simples (além de espetacular, é claro). Mas a proposta era clicar Notre-Dame com os olhos do Quasímodo (o famoso Corcunda). Fiquei me perguntando como faria isso, colocar-me no lugar de um personagem que viveu dentro da catedral, escondido. O projeto consistia em produzir imagens para uma exposição a ser apresentada no foyer do teatro a partir da estreia da peça.

Passei 15 dias de novembro de 2013 vivenciando Notre-Dame. Era o ano em que a catedral comemorou 850 anos. Eu nunca havia ido a Europa, tampouco a Paris, e tinha apenas algumas imagens na cabeça sobre como era a catedral. Confesso que não quis fazer pesquisas prévias no Google, para ser surpreendida e não cair no olhar comum que os turistas costumam lançar sobre o local.

Quando cheguei, senti um misto de encanto com reflexão. É um lugar “forte”, com muita energia e muitas pessoas rezando, acendendo velas, fazendo pedidos. Só na fachada fiquei horas e horas admirando cada detalhe. Apenas as portas da entrada principal mereciam dias de observação. Já o interior é surpreendente. Escuro, amarelado. O teto é todo trabalhado, unindo-se a várias colunas, repletas de detalhes. Ao vislumbrar o teto, não há como não admirar os lustres, repletos de candelabros e velas, que acentuam a tonalidade amarelada. Ao descer a visão, deparo com os vitrais góticos e as rosáceas, emblemáticos de Notre-Dame. E lá se vão mais horas para observar, clicar e admirar.

Em meio aos cliques, pude ouvir o famoso órgão da catedral, um som surpreendente. Mexe na alma, dá medo mas me faz relembrar do Corcunda. Só ouvi uma vez – e lembro bem até hoje.

Percebi que não poderia clicar o altar tão próximo o quanto eu gostaria. Mesmo assim, acredito que ele me deu as imagens mais especiais do interior da catedral, pois pude perceber alguns detalhes da escultura da Pietà que, para muitos, passam desapercebidos.

Pude visitar alguns locais de Notre-Dame que menos pessoas visitam, que são os locais pagos. Nos acervos, por exemplo, presenciei peças incríveis! Vestimentas e instrumentos da Igreja Católica e de alguns papas, joias e tesouros inestimáveis da História, assim como a possibilidade de chegar pertinho de outros vitrais.

Mas a maior experiência à la Quasímodo foi quando subi nas torres. Pelas escadarias espirais de degraus apertados, pude conferir a paisagem de Paris através de pequenas janelas. A cidade é tão grande, mas ficava pequena vista dali. No alto das torres, os gárgulas me encaravam de cara feia. Mas eu sabia que eles estavam lá para proteger Notre-Dame, e, no fim, acabavam me protegendo também, pois o inusitado ocorreu: quando eu estava no alto das torres, com mochila, câmeras e lentes, um temporal chegou de repente, surpreendendo a cidade toda. Os turistas saíram correndo, e eu fiquei. Até conseguir juntar os materiais e guardá-los, não me restou melhor opção a não ser abrigar-me em um pequeno telhadinho de frente para um gárgula até que o resgate aparecesse. Aquele gárgula que me protegeu gerou um belo quadro para a exposição.
A fachada: imponência - Lisa Roos / Acervo Pessoal




O altar - Lisa Roos / Acervo Pessoal







A iluminação peculiar, escura, amarelada - Lisa Roos / Acervo Pessoal








Os gárgulas - Lisa Roos / Acervo Pessoal

Na tragédia da Notre-Dame, o Gótico venceu o fogo

As estruturas dos templos góticos para dar forma e sustentação à grande altura dos edifícios mostraram a sua tremenda consistência, avalia especialista em patrimônio histórico e artístico

Por José Francisco Alves
Doutor em História da Arte, especialista em patrimônio cultural

Catedrais do patrimônio cultural sob o fogo têm chocado a quase todos. Está virando frequente. Ainda em nossa memória consta viva a destruição do Museu Nacional, ocorrida há sete meses. E ainda presente para alguns porto-alegrenses estão as chamas que consumiram, em 6 de julho de 2013, parte considerável do Mercado Público – o mais importante patrimônio tombado da capital gaúcha. Enquanto o Museu Nacional desapareceu completamente (prédio, acervo), o nosso amado Mercado com suas bases de meados do século 19 sobreviveu bem ao incêndio: a parte afetada foi restaurada com recursos do extinto Ministério da Cultura, e, finalmente, neste mês alcançou a liberação da área atingida.

Agora foi Notre-Dame. A icônica nave medieval de pedra ardeu em Paris. Claro, o que vimos queimar nas cenas chocantes foi o intrincado madeirame de seu telhado, quase uma floresta inteira de carvalho e castanheira de 850 anos de idade. O fogo consumiu principalmente a cobertura de folhas de chumbo e a estreita e pontiaguda torre, a flecha (ou agulha). Esse incêndio na sede da Arquidiocese parisiense ocupa os noticiários e as sensibilidades do mundo inteiro desde a última segunda-feira. A história e as características desse monumento da humanidade têm sido amplamente difundidas, portanto, mais dados aqui seriam redundantes.

Mas, para resumir, Notre-Dame foi erguida sobre a primeira igreja cristã de Paris, Saint-Etienne (esta, por sua vez, construída sobre templos pagãos). A Catedral foi dedicada à Virgem Maria e a sua construção se iniciou no ano de 1163, tida como concluída em 1345, ou seja, 155 anos antes da chegada de Cabral ao Brasil. No século 19, o templo foi restaurado (recomposto em estruturas danificadas pelo tempo) e teve o projeto original transformado com acréscimos significativos, a exemplo da mencionada flecha, estátuas em bronze de santos e apóstolos, bem como novos gárgulas de pedra, intervenções estas sob projeto do arquiteto Eugène-Emmanuel Viollet-le-Duc (1814–1879), com participação de Jean Baptiste Lassus.

Considera-se que essa Catedral é o ponto turístico mais visitado da França. É uma comparação injusta, mas, enquanto Notre-Dame recebe de 13 milhões a 15 milhões de turistas anualmente (as estimativas oficiais e informais variam muito), o Brasil todo sonha em alcançar 7 milhões por ano. Bens simbólicos encerram em si uma potência tremenda, que vai além das paredes de pedra. Mas soma-se ao caso o imenso orgulho que os franceses têm de seu patrimônio cultural material e imaterial, ou seja, com a sua Cultura. Quem conhece um pouco a França e os franceses sabe que esse orgulho difere substancialmente de certos patriotismos dominantes.

E foi a Cultura que parou o fogo de Notre-Dame; mais especificamente, o Gótico.

O Gótico foi uma época da cultura ocidental na Idade Média. A partir dos templos católicos franceses, na arquitetura e na arte o Gótico produziu o seu estilo inconfundível. Suas catedrais foram projetadas com o objetivo de alcançar a Deus, mas de forma a mostrar que Ele está bastante acima dos fiéis. Como intermédio entre ambos, a Igreja Católica. As invenções estruturais dos templos góticos para dar forma e sustentação à grande altura dos edifícios mostraram nesse incêndio a sua tremenda consistência. A maioria das abóbadas, feitas de blocos de pedra (suportadas pelos icônicos contrafortes e arcobotantes), conseguiu aguentar o seu próprio peso, o imenso poder do calor, as toneladas de chumbo derretido e as toras incandescentes. Salvou-se, assim, um significativo acervo artístico e religioso do interior da Catedral. Algo que, vendo as imagens do incêndio, parecia impossível de acontecer.

E quem irá recuperar Notre-Dame será o orgulho francês, com muito dinheiro privado e público. É quase um masoquismo nosso, mas, ao vermos a reação da sociedade francesa, em especial a disputa de bilionários por quem dará mais dinheiro para o restauro (segundo o Le Monde, até uma bilionária brasileira já teria oferecido milhões de euros), bateu a lembrança de como foi a comoção de nossa elite endinheirada quando da tragédia cultural do Museu Nacional. Ou seja, nenhuma. Nada. Dinheiro algum dessa gente.

Como algo de nosso inconsciente, àquela altura nem sequer esperamos algo a respeito, pois “de onde menos se espera, é que não virá nada mesmo”. As cobranças, só ao governo. Ao incêndio cultural permanente do Brasil, portanto, nos falta um Gótico.
Incêndio consumiu um ícone da cultura ocidental na última segunda-feira

Política de Gestão Turística do Patrimônio Mundial é assinada

O turismo sustentável em cidades históricas e sítios reconhecidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) tem agora uma nova política de fomento. A Política Nacional de Gestão Turística dos Sítios Patrimônio Mundial tem o objetivo de estabelecer diretrizes para estimular o turismo sustentável nos 21 sítios brasileiros que recebem o título por seu excepcional valor universal para a humanidade. 
O decreto elaborado pelo Ministério do Turismo, em parceria com o Ministério da Cidadania e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), foi assinado em Brasília, nesta quinta-feira, dia 11 de abril, pelo presidente Jair Bolsonaro. Na ocasião também estiveram presentes o ministro da Cidadania, Osmar Terra; o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio; o ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto; o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles e a presidente do Iphan, Kátia Bogéa.
Com essa política, espera-se que cada vez mais turistas brasileiros e estrangeiros conheçam e visitem destinos e riquezas reconhecidos mundialmente pela Unesco no Brasil, mas sem descuidar da preservação e do respeito à cultura local. 2019 será o ano do Patrimônio mais Turismo, o que envolve um conjunto de ações de valorização dos destinos turísticos de dominância patrimonial, no Brasil. 
De acordo com o ministro da Cidadania, Osmar Terra, com a Política, um conjunto de ações está sendo programado, que vai permitir melhor estruturação dos destinos turísticos Patrimônio Mundial. “Essas ações vão impulsionar o turismo nessas cidades, movimentando a economia local, gerando emprego e renda, mas sem descuidar da preservação”, disse ele. 
A presidente do Iphan, Kátia Bogéa, afirmou que a assinatura do decreto “é  um momento importante para a política de patrimônio no país, um divisor de águas, na medida em que se busca, a partir de uma nova abordagem, considerar a dimensão econômica e a atividade turística como uma via para a sensibilização, o aprendizado e o desfrute do rico Patrimônio Cultural Brasileiro”.
As ações relacionadas às atividades turísticas voltadas ao Patrimônio Mundial serão implementadas de forma transversal aos planos, programas e projetos das entidades envolvidas em sua execução. Entre outras medidas, o decreto prevê o desenvolvimento e implantação de sinalização turística padronizada, interativa e acessível às pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, nos sítios Patrimônio Mundial e seus entornos.
Outra ação a ser desenvolvida este ano é a implantação de Centros de Interpretação Turística, para atendimento aos turistas e visitantes, nos sítios Patrimônio Mundial. Em maio de 2019, o Brasil enviará uma missão de intercâmbio com gestores, prefeitos e trade turístico brasileiros a Portugal. O objetivo é conhecer referências em Centros de Interpretação portugueses, a fim trazer modelos para as 13 cidades detentoras de sítios culturais Patrimônio Mundial, no Brasil. Os Centros de Interpretação oferecem atendimento a turistas e visitantes, com informações sobre o sítio histórico, atrativos locais, programação cultural, entre outros serviços e produtos.

Metas do Patrimônio mais Turismo
As metas da nova política estão alinhadas à Política Nacional de Turismo, ao Plano Nacional de Turismo, à Política de Patrimônio Cultural, à Política Nacional do Meio Ambiente, ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação, ao Plano Nacional de Áreas Protegidas, à Política Nacional de Desenvolvimento Urbano e suas políticas setoriais de habitação, saneamento e mobilidade.
Além do decreto federal que institui a Política Nacional de Gestão Turística dos Sítios Patrimônio Mundial, está em curso a estruturação e lançamento do Programa Nacional de Turismo Cultural. Neste ano, haverá ainda atualização e lançamento do Guia Brasileiro de Sinalização Turística e a produção de guias turísticos para cada sítio Patrimônio Cultural Mundial.
Está prevista a criação de linhas de crédito para a implantação, melhoria, conservação e manutenção de empreendimentos turísticos e sinalização turística em sítios Patrimônio Mundial. Outra medida em desenvolvimento é o Sistema de Certificação de Destinos Patrimoniais, que busca fomentar o processo de qualificação dos destinos turísticos que possuam como atrativos de primeira ordem o patrimônio cultural existente. 
14 sítios Patrimônio Cultural Mundial
Os bens culturais brasileiros inscritos na Lista de Patrimônio Mundial por seu excepcional valor para a cultura da humanidade são monumentos, conjuntos urbanos, sítios arqueológicos e paisagens culturais de fundamental importância para a memória, a identidade e a criatividade dos povos e a riqueza das culturas:Centro Histórico de Ouro Preto, Minas Gerais
  • Centro Histórico de Olinda, Pernambuco
  • Missões Jesuíticas Guarani no Brasil, ruínas de São Miguel das Missões, Rio Grande do Sul
  • Centro Histórico de Salvador, Bahia
  • Santuário do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, Minas Gerais
  • Plano Piloto de Brasília, Distrito Federal
  • Parque Nacional Serra da Capivara, em São Raimundo Nonato, Piauí
  • Centro Histórico de São Luís, Maranhão
  • Centro Histórico da Cidade de Diamantina, Minas Gerais
  • Centro Histórico da Cidade de Goiás
  • Praça São Francisco, em São Cristóvão, Sergipe
  • Rio de Janeiro, paisagens cariocas entre a montanha e o mar
  • Conjunto Moderno da Pampulha, em Belo Horizonte, Minas Gerais
  • Sítio Arqueológico Cais do Valongo, no Rio de Janeiro

7 sítios Patrimônio Natural Mundial
Você sabia que o Brasil tem sete sítios naturais inscritos na Lista do Patrimônio Mundial? São formações físicas, biológicas e geológicas excepcionais, habitats  de espécies animais e vegetais ameaçadas e áreas de valor científico. Conheça:
  • Parque Nacional de Iguaçu, em Foz do Iguaçu, Paraná e Argentina
  • Mata Atlântica - Reservas do Sudeste, São Paulo e Paraná
  • Costa do Descobrimento - Reservas da Mata Atlântica, Bahia e Espírito Santo
  • Complexo de Áreas Protegidas da Amazônia Central
  • Complexo de Áreas Protegidas do Pantanal, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul
  • Áreas protegidas do Cerrado: Chapada dos Veadeiros e Parque Nacional das Emas, Goiás
  • Ilhas Atlânticas Brasileiras: Reservas de Fernando de Noronha e Atol das Rocas

5 bens Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade
O Brasil também conta com cinco bens reconhecidos como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. São práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhe são associados – de grande valor para as comuni¬dades.  
 
Samba de Roda no Recôncavo Baiano, na Bahia
Arte Kusiwa – Pintura Corporal e Arte Gráfica Wajãpi, no Amapá 
Frevo: Expressão Artística do Carnaval de Recife, em Pernambuco
Círio de Nossa Senhora de Nazaré, em Belém, Pará
Roda de Capoeira – bem de abrangência nacional 
 
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Fernanda Pereira – fernanda.pereira@iphan.gov.br 
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Fonte da Imagem: Site Iphan