domingo, 16 de junho de 2019

Primo gaúcho do Museu Niemeyer, prédio em formato de olho ficou quase uma década no centro de Porto Alegre

Projetado pelo arquiteto Marcos Heckman em 1958, construção foi o pavilhão de Exposições do Governo do Estado do Rio Grande do Sul

Sentir-se observado ao caminhar pela rua foi uma constante para quem circulava pela Avenida Borges de Medeiros, no centro de Porto Alegre, na década de 1960. Na esquina com a Rua General Andrade Neves, um prédio em formato de olho capturava a atenção dos pedestres, destacando-se em meio às construções convencionais do entorno. 

A edificação, uma espécie de prima gaúcha do Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, foi o pavilhão de Exposições do Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Projetado pelo arquiteto Marcos David Heckman em 1958, o prédio em madeira é anterior ao emblemático museu do Paraná, mas também foi inspirado no trabalho do arquiteto mais famoso do Brasil. Concebido por Niemeyer em 1954, o auditório do Liceu Belo Horizonte, em Minas Gerais, foi a principal referência de Heckman para a obra porto-alegrense. 

Apesar de remeter ao formato de um olho, foi apelidado de acordo com as referências da época: ficou conhecido como Mata-Borrão. A base da construção tinha formato de barco, semelhante ao instrumento utilizado para absorver o excesso de tinta do papel antes das canetas esferográficas. 

— Era para ser uma estrutura temporária para abrigar exposições do governo do Estado, mas ficou ali por um bom tempo. Era muito diferente de tudo o que se tinha visto até então — recorda a arquiteta Anna Paula Canez, autora do artigo Mata-Borrão: um grande olho de madeira no centro da Porto Alegre da década de 1960. 

O prédio, localizado onde hoje fica o Tudo Fácil, foi demolido no final dos anos 1960. Professora da UFRGS, a arquiteta só tomou conhecimento dele nos anos 2000 — mais tarde, lembrou de ter visitado o local quando criança. Lecionava na Uniritter quando, em um acervo fotográfico, deparou com uma foto noturna do grande olho iluminado. Impressionada com a beleza da imagem, foi atrás de Heckman, que, inicialmente, negou a autoria. 

— À noite, era lindo, parecia que flutuava. O Heckman tinha uma referência presente da obra do Niemeyer, mas se incomodava com a comparação. Mas é um prédio diferente, feito em outro material. Quando voltei a procurá-lo, ele admitiu — conta a professora. 

Diferente da solução proposta pelo arquiteto carioca, que projetou a construção pousada sobre o solo, o Mata-Borrão ficava levemente ancorado por pilares de madeira e pela rampa de entrada, deslocada do centro. À noite, as estruturas eram apagadas pela escuridão, ficando em evidência apenas o olho. Dotado de múltiplas janelas de vidro, o edifício com as luzes acesas tornava-se um ponto brilhante, destacado na Avenida Borges de Medeiros. 

A opção pela madeira, além de mostrar-se mais econômica e fácil de desmontar, fazia alusão às realizações do então governador Leonel Brizola na área educacional. Conhecidas como “brizoletas”, diversas escolas erguidas durante sua gestão foram construídas com esse material.

— Acho que o arquiteto acertou, foi ousado na forma e cumpriu com o propósito de abrigar as exposições. Ficou na memória de quem viveu, e quem não viveu e vê as imagens daquela época quer saber como aquela nave pousou no centro de Porto Alegre — diz Anna Canez. 

Construção quase deu lugar a prédio de Niemeyer

Depois de abrigar por quase uma década com uma construção que lembrava a obra de Niemeyer, o terreno da Avenida Borges de Medeiros chegou muito perto de ter uma edificação projetada pelo arquiteto carioca.

O projeto de um prédio em estilo modernista para a área estava pronto quando foi barrado pela prefeitura de Porto Alegre. À época, o poder público municipal julgou que a proposta de Niemeyer destoaria das demais construções da Borges de Medeiros. 

— Por coincidência, houve esse projeto para aquela área. Era de uma arquitetura elegante, mas a prefeitura achou que era moderno demais. No fim, foi construído um prédio quadrado — lamenta a professora da UFRGS. 

Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/porto-alegre/noticia/2019/06/primo-gaucho-do-museu-niemeyer-predio-em-formato-de-olho-ficou-quase-uma-decada-no-centro-de-porto-alegre-cjwl5s14v03of01qtfxj1waie.html

















Prédio foi pavilhão de exposições do governo do Estado
ACERVO JOÃO ALBERTO / UNIRITTER


Prédio sediou "comitê de resistência democrática" durante a crise da legalidade, em 1961
Jornal Última Hora / Agencia RBS








Projeto do prédio construído em 1958
Hélio Ricardo Alves / Reprodução







O cenário do "mata-borrão" em meio aos demais prédios do centro de Porto Alegre

ACERVO JOÃO ALBERTO / UNIRITTER







Pavilhão também foi centro de imprensa durante a universíade de 1963
Reprodução / Reprodução









O Olho de Niemeyer em Curitiba - Museu Oscar Niemeyer.
Fotos Carlos Renato Fernandes

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