Escrito por Breno Vaz
Quem chega hoje à cidade de São Lourenço da Mata sente
aquele ar campestre, em que as coisas parecem caminhar mais devagar,
dando a impressão que nem estamos na região metropolitana do Recife. A
cidade que combina o urbano com o rural carrega, ao mesmo tempo, a
expectativa de desenvolvimento para o futuro e a herança rústica do
passado. O estabelecimento nela da Arena Pernambuco (estádio de futebol
que sediará os jogos da Copa do Mundo de 2014) traz
para a população a expectativa de mudanças, justamente no sentido de que
a cidade deixe para trás a herança rural que é identificada com o
atraso, e siga para a modernidade e prosperidade sugerida por sua nova
alcunha: “Cidade da Copa”.
O que os são-lourencenses e pernambucanos provavelmente não sabem é que
a “Cidade da Copa” já foi a “Cidade do Açúcar”. E de muito açúcar. São
Lourenço de outrora era uma freguesia (hoje chamaríamos de distrito)
que, juntamente com outras, fazia parte do município de Olinda entre os
séculos 16 e 18. Nesses tempos coloniais, o produto era a grande riqueza
da capitania de Pernambuco, que chegou a ter o maior número de engenhos
entre todas as do Brasil até a invasão holandesa (1630). Olinda, além
de ser a sede da capitania, possuía o maior destaque nos negócios do
açúcar, pois lá estavam também os melhores engenhos. Portanto, era deles
que saía a maior e melhor produção açucareira de Pernambuco.
O açúcar de São Lourenço se destacava desde os primórdios da capitania.
O historiador Pereira da Costa afirma que, em 1575, nessa produção
destacavam-se as localidades de Igarassu, Nazaré e São Lourenço, que iam
“caminhando prosperamente”. Pouco depois, às vésperas da invasão
holandesa, São Lourenço possuía pelo menos um engenho dentro do seleto
grupo dos 10 maiores de Pernambuco. Tratava-se do Massiape, de
propriedade de Francisco do Rego Barros, figura que ocupava uma posição
de destaque na “nobreza da terra” de Olinda. Ocupou uma série de cargos
importantes, como presidente da Câmara de Olinda, juiz dos órfãos da
capitania de Pernambuco, coronel do regimento miliciano, além de possuir
as honrarias de Fidalgo da Casa Real e de Cavaleiro da Ordem de Cristo.
O fato de uma figura tão rica e ilustre possuir um engenho em São
Lourenço certamente indica um sinal da importância da freguesia na
produção de açúcar no período.
Na segunda metade do século 17, apesar do contexto geral de crise para o
açúcar em Pernambuco, os engenhos de São Lourenço alcançaram uma
expansão impressionante. Em 1698, a freguesia chegou à notável marca de
29 engenhos, maior número entre todas as freguesias de Olinda. O que
também impressiona é o fato de São Lourenço ser a freguesia mais
distante do porto do Recife, onde se embarcavam as caixas de açúcar.
Essa distância era compensada pela fertilidade dos solos onde brotava a
cana de açúcar, que eram reputados entre os melhores da capitania. De
modo que, já nos fins dos seiscentos, São Lourenço já era a localidade
mais importante para o açúcar pernambucano.
No meado do século 18, a agora “Cidade da Copa” reafirmava sua posição
como a terra do açúcar. Á época, a área que abrigava a antiga freguesia
de São Lourenço da Mata dividia seu espaço com uma nova e vizinha
freguesia: Nossa Senhora da Luz. Cada uma destas “freguesias irmãs”
possuía, então, 18 engenhos.
Considerando que Nossa Senhora da Luz localizava-se em parte das terras
que anteriormente pertenciam à freguesia de São Lourenço – e que hoje
pertence como distrito ao atual município de São Lourenço da Mata –,
percebemos que a atual área do município fica em um território onde, no
meado do século 18, existiam duas freguesias de extraordinária
importância na produção de açúcar. De tal modo que, se somarmos o número
de engenhos das duas freguesias nesta mesma época, teríamos um total de
36 engenhos, um número extremamente expressivo. Número superior ao de
vilas açucareiras importantes de capitanias como Igarassu, Serinhaém e
Alagoas, que possuíam respectivamente 35, 27 e 33 engenhos. E até mesmo
superior a toda a capitania de Itamaracá, que neste momento possuía 35
engenhos.
Se conhecer a nossa história serve, sobretudo, para melhor se
compreender o presente e tentar programar o futuro, são-lourencenses e
pernambucanos merecem conhecer o passado de uma cidade que já foi, com
seu açúcar, a terra mais rica de Pernambuco. Numa época de expectativas e
de ânsia por mudanças, o conhecimento desse passado pode trazer novas
reflexões sobre o nosso presente e redimensionar nossas esperanças de
futuro.
Imbricada entre passado, presente e futuro, a “Cidade da Copa” vai
caminhando com sua pesada bagagem nas costas, seus pés titubeantes e
olhos que só veem à frente.
A esquerda o Engenho Muribara, a esquerda o Engenho Tapacurá
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