Lançada em dezembro de 2012, alguns dias antes de completar 103 anos de idade, o hoje falecido arquiteto Oscar Niemeyer, o grande nome da arquitetura brasileira e um dois maiores nomes da arquitetura mundial, também aventurou-se como compositor.
A música tem o nome de “Tranquilo com a Vida” e começou a criar forma em
2009, com os primeiros versos de Niemeyer. Na época, o enfermeiro do
arquiteto começou a musicar a composição, que acabou engavetada por
meses. Tempos depois a família de Niemeyer entrou em contato com o
cantor e compositor Edu Krieger perguntando se ele gostaria de finalizar
a canção.
“Aceitei na hora o convite e tratei de arrematá-la: coloquei a letra na métrica, criei uma segunda parte para a melodia e harmonizei. Entrei em estúdio, gravei o samba e mandei para a família Niemeyer. Todos adoraram o resultado, principalmente o grande Oscar, que me convidou para ir a seu escritório conhecê-lo”, contou Krieger.
“Achei muito emocionante virar parceiro deste ilustre sambista novato, de primeira viagem, ainda que mais velho que lendas como Noel Rosa e Adoniran Barbosa”.
“Aceitei na hora o convite e tratei de arrematá-la: coloquei a letra na métrica, criei uma segunda parte para a melodia e harmonizei. Entrei em estúdio, gravei o samba e mandei para a família Niemeyer. Todos adoraram o resultado, principalmente o grande Oscar, que me convidou para ir a seu escritório conhecê-lo”, contou Krieger.
“Achei muito emocionante virar parceiro deste ilustre sambista novato, de primeira viagem, ainda que mais velho que lendas como Noel Rosa e Adoniran Barbosa”.
A proposta da parceria chegou a Krieger via Caíque Niemeyer, bisneto
do arquiteto - namorado de uma amiga do compositor e admirador de seu
trabalho. O samba estava parado havia alguns meses. Niemeyer e Caio - em
sua primeira incursão no terreno - não sabiam como continuar a canção.
Caíque então sugeriu o parceiro ao bisavô. Sugestão aceita, ele mandou a
letra e o princípio de melodia a Krieger.
- Não mexi em nada da letra, fiz questão de deixar cada palavra que
Niemeyer tinha escrito. Finalizei a melodia e fiz a harmonia em dois
dias. Depois, gravei uma demo, para ele conhecer. A receptividade foi
enorme, ele me convidou para ir ao seu escritório e passamos algumas
horas juntos só cantando o samba. Mais tarde, fiz a gravação definitiva
chamando amigos da Lapa como Alessandro Cardozo (cavaquinho), PC
Castilho (flauta), Fabiano Salek >ita<(percussão), Elisa Addor e
Alice Passos (coro). Soube depois que ele mostra a gravação a cônsules,
todos os visitantes ilustres que recebe lá - conta o artista de 36 anos,
66 a menos que Niemeyer. - Ficou com cara de samba do subúrbio,
simples, direto, tipo Zé Luiz do Império, algumas coisas do Martinho.
A letra de "Tranquilo com a vida" é fiel às ideias que o comunista
Niemeyer tem defendido ao longo de sua trajetória. Enquanto aproveita os
prazeres simples da vida, o personagem, um morador da favela que canta
em primeira pessoa, se dá conta das injustiças do mundo. No fim,
conciliatório, diz não culpar os ricos e imagina um futuro com igualdade
social.
- Está ali tudo o que ele vem dizendo nas últimas décadas. Um olhar
mais atencioso para os pobres, melhor distribuição de renda... Isso só
aumenta o valor histórico da música - avalia Krieger. - Ele se coloca
como um personagem morador de favela, nunca perdeu a ligação com esse
olhar. E, o mais bonito, continua esperançoso. De forma simples, os
versos contêm uma esperança de que a diferença de classes se atenuará e
as pessoas se reaproximarão. Não há o rancor de outras canções que
trazem um tom político. É uma canção de protesto, mas que oferece flores
à sociedade. É o reflexo de uma sabedoria de 103 anos.
As palavras de Krieger sobre o papel da experiência na visão de
Niemeyer ganham mais força quando se ouve sua única tentativa anterior
na área da composição. Em 1962, ele se arriscou no "Samba do arquiteto",
no qual conclamava seus colegas de profissão a se juntarem à revolução:
"Mas se você é honrado/ Não deve se conformar/ Ponha a prancheta de
lado/ E venha colaborar/ O pobre cansou da fome/ Cansou de ter que
esperar/ E vai partir para a luta." Bem menos mulato que "Tranquilo com a
vida".
Como o próprio Niemeyer lembra, sua relação com o samba vem de muito
tempo. São dele os cenários de "Orfeu da Conceição" - primeiro trabalho
de Tom Jobim e Vinicius de Moraes juntos. É dele também o desenho do
Sambódromo. Sobre o carnaval, aliás, ele já disse que "a escola de samba
deveria servir como veículo de protesto, para cantar os anseios da
gente pobre". E Chico Buarque afirmou que pensa sua música tendo a obra
de Tom e Niemeyer como alvos: "Quando minha música sai boa, penso que
parece música de Tom. Música de Tom, na minha cabeça, é casa do Oscar."
Letra e vídeo da composição:
Tranquilo com a Vida
(Oscar Niemeyer / Edu Krieger / Caio Almeida)
Hoje em dia minha vida vai ser diferente
Calça de pijama, camisa listrada, sandália no pé
Andar pela praia vou fazer toda manhã
E até moça bonita vai ter se Deus quiser
Vou parar nos cafés pra ouvir historinhas
Coisas da vida que um dia vão ter que mudar
Quero ser um mulato que sabe a verdade
E que ao lado dos pobres prefere ficar
E assim vou eu
Tranqüilo com a vida
À espera da noite já solta no ar
Como um manto de estrelas com que se anuncia
E se multiplica nas águas do mar
Da minha favela eu vejo os grã-finos
Morando na praia, de frente pro mar
Não devemos culpá-los
São prestigiados
Que um dia entre nós vão voltar a morar
Oscar Niemeyer e Edu Krieger: parceiros com 66 anos de diferença Foto Divulgação - Alfredo Alves -
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