terça-feira, 22 de janeiro de 2013

SP – Por que preservar imóveis antigos? Entenda os critérios para salvá-los

O desaparecimento de edificações para o surgimento de outros empreendimentos imobiliários pode ser encarado como o movimento evolutivo da cidade, resultado de seu crescimento e de sua renovação natural. Porém, quando uma construção antiga vem abaixo em meio às mudanças urbanas, questionamentos da sociedade podem surgir: o que precisa ser preservado? Que história arquitetônica deve ser resguardada às futuras gerações?
Para o arquiteto e especialista em projetos de reforma e restauro de imóveis antigos, Samuel Kruchin, a preservação de uma edificação de época pode estar atrelada a sua técnica e qualidade arquitetônica, aos aspectos que remetam a um significado histórico ou cultural ou ainda a um valor ambiental que permita e justifique sua salvaguarda.
O professor de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Campinas (Pontifícia Universidade Católica de Campinas), João Verde, ratifica que os elementos construtivos e históricos da edificação são fatores que tendem a determinar sua proteção. “Pode ser que esteticamente o imóvel não seja belo na sua arquitetura, porém isso não determina sua importância para a história da cidade ou da comunidade local, o que tende a conferir ênfase a sua preservação”, explica.
Em 2010, o casarão centenário localizado no número 539 da rua Bela Cintra, em São Paulo, que abrigava o bar Geni desde 2005, foi demolido para dar lugar a um edifício comercial. Outro exemplo mais recente na capital paulista é o do casarão na rua Haddock Lobo, 141, onde funcionava o restaurante Pão com Manteiga, que também foi posto abaixo no final de 2012.
“Com relação a estas duas demolições, posso dizer que são perdas,  principalmente por se tratarem de prédios que tinham atividades comerciais importantes e que mantinham relações de reconhecimento e de carinho com seus usuários”, opina Verde.
Por sua vez, Kruchin lamenta a eliminação do casarão da rua Bela Cintra porque “parecia possuir um apuro arquitetônico, certa elegância em suas proporções, certo refinamento em suas linhas a sugerir um rico espaço interno”. Porém o arquiteto ressalta que é preciso tomar cuidado também com a “onda” de imputar valor histórico e arquitetônico a tudo que é antigo pelo simples fato de o ser. “Como se qualquer demolição fosse crime, o que não é”, completa.

O tombo
Em São Paulo, como em outras cidades antigas, há construções tombadas por algum órgão de preservação – Iphan, Condephaat, entre outros -, que as qualificam como patrimônio cultural. De acordo com a Constituição Federal, em seu artigo 216, “constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial tombados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”.
Conforme informações contidas no site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), qualquer pessoa física ou jurídica pode pedir o tombamento de bens culturais e naturais aos órgãos responsáveis pela preservação. Na cidade de São Paulo, um imóvel pode ser tombado pelas esferas federal (Iphan), estadual (Condephaat – Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) e municipal (Conpresp – Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo).
De acordo com o Condephaat (e, portanto, em esfera estadual), o requisito básico para um imóvel ser preservado é possuir valor relevante para todo o estado de São Paulo. Além disso, outros elementos são avaliados no processo de tombamento, entre eles o significado histórico da construção, sua excepcionalidade arquitetônica, se há um acabamento artístico distinto (ou seja, a presença de obras, ornamentos e objetos de arte de qualidade artística) e valores afetivos.
Kruchin ressalta que hoje há um avanço substancial quanto ao desejo comunitário de manter a herança arquitetônica das cidades. Seja em São Paulo, no interior ou em outro estado, segundo ele, os conselhos governamentais reservam um papel importante à execução desta manutenção histórica. “Eu vejo, também, um movimento comunitário que não se via há uns dez anos, é uma consciência de preservação, talvez, mais consistente”. Para Verde, esta mobilização, por menor que ainda seja, pode possibilitar à população o conhecimento “in loco” dos métodos construtivos importantes de uma época.

Resguardado, mas não salvo
Contudo o tombamento de uma edificação por determinada esfera pública não garante sua conservação e restauro, que são de responsabilidade exclusiva do proprietário. Alguns imóveis tombados na cidade de São Paulo estão abandonados e são objetos de disputa judicial que impedem seu uso e sua efetiva preservação.
Para aquelas construções antigas que ainda resistem às iniciativas imobiliárias, além do tombamento, há outras formas de salvaguarda e fuga da demolição. O planejamento urbano de uma cidade, por exemplo, pode inserir em seus planos diretores iniciativas de preservação e ainda criar leis específicas para este fim.

De acordo com a Prefeitura de São Paulo, na atual legislação que rege o Plano Diretor Estratégico do município foram aperfeiçoados instrumentos de proteção, incentivo e fiscalização, relativos ao uso das Zonas Especiais de Preservação Cultural (Zepec) como meio de complementar a proteção ao patrimônio histórico junto ao tombamento.
As Zonas Especiais de Preservação Cultural são porções do território destinadas à preservação, recuperação e manutenção do patrimônio histórico, artístico e arqueológico, podendo se configurar como sítios, edifícios ou conjuntos urbanos. As leis 13.430-2002 e 13.885-2004 reúnem os principais artigos que tratam das Zepecs e podem ser consultadas no site da Prefeitura.

Uma São Paulo Antiga
O projeto São Paulo Antiga (SPa), uma iniciativa do fotógrafo Douglas Nascimento, propõe documentar a transformação da cidade de São Paulo por meio do registro e catalogação de fotos de imóveis antigos, preservados ou não. Idealizado em 2009, o site do projeto reúne atualmente cerca de 600 construções. São casas, sobrados, palacetes, prédios, entre outras edificações que permanecem em pé, ocupadas ou não, muitas vezes deterioradas ou até já demolidas.
Inspirado em experiências semelhantes em países como Argentina e Portugal, o fotógrafo percebeu que sua prática despretensiosa de fotografar edificações durante passeios pela cidade de São Paulo poderia virar um acervo de registro. “Com a catalogação que sempre fazia destas imagens, comecei a perceber mudanças na cidade. Percebi que muitas casas registradas estavam sendo demolidas e por isso precisava tentar perpetuar a imagem desses imóveis que estavam desaparecendo”, explica Nascimento.
Com o objetivo de manter viva, ainda que somente em fotos, a memória arquitetônica paulistana, Nascimento publica no SPa registros e informações próprios e conseguidos pela colaboração dos leitores. “Como São Paulo é muito grande, a participação do internauta é indispensável. Eles avisam, por exemplo, quando algum imóvel já catalogado está sendo demolido”, diz. Por Karine Serezuella

Fonte: http://www.defender.org.br/sp-por-que-preservar-imoveis-antigos-entenda-os-criterios-para-salva-los/












Hoje um hostel, a antiga residência, em São Paulo, mantém suas características originais preservadas. Douglas Nascimento/Divulgação 

















Construído em 1905, o palacete Franco de Mello, em São Paulo, é tombado pelo Condephaat (1992).





















Casarão “Pão com Manteiga” , da década de 1920, foi demolido em 2012. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário