sábado, 9 de fevereiro de 2013

Cidade histórica partida

Prefeitura de Ouro Preto gera polêmica ao propor separar secretaria de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano. Especialistas condenam a proposta do governo 

Aline Salgado 

“Querem seccionar a leitura da cidade.” É assim que Cristina Simão, arquiteta e professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais, tenta explicar um polêmico projeto em Outro Preto. A prefeitura quer desvincular as secretarias de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano, ligando o setor que fiscaliza e cuida da manutenção dos bens tombados na cidade histórica à pasta de Cultura.
 
“O nosso patrimônio é um patrimônio edificado e urbano”, continua ela. “A leitura tem que ser conjunta. Não são movimentos isolados. Essa era uma batalha antiga. Por sete anos conseguimos unificar as secretaria de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano, e deu muito certo”, argumenta Cristina Simão, que faz parte da comissão formada por técnicos em arquitetura, urbanismo e patrimônio que já reuniu 47 assinaturas contra a proposta do governo e as entregou aos vereadores.
A prefeitura promete que a mudança não vai pôr em risco a preservação do conjunto paisagístico de Ouro Preto, tombado pela Unesco em 1970, e sim desburocratizar o setor responsável por conceder as licenças para construção na cidade. Para especialistas em patrimônio, no entanto, a nova formulação pode ser um retrocesso e um risco à preservação das áreas verdes e sítios arqueológicos no entorno do perímetro urbano.
O secretário de Patrimônio de Ouro Preto, José Alberto Pinheiro, rebate as críticas e diz que os projetos urbanísticos continuarão passando pelo crivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan. “Não vamos mexer no perímetro urbano. Nessa área, os técnicos do instituto continuarão a atuar. O que estava acontecendo é que de quatro projetos que chegavam à secretaria, três se relacionavam com imóveis fora do centro histórico. Estávamos usando técnicos muitos especializados para problemas que não se relacionavam à área tombada. Vamos dar mais agilidade à secretaria”, garante.
Ciente da polêmica que tomou conta de Ouro Preto, a presidente do Iphan, Jurema Machado, prefere dar um voto de confiança à administração municipal. Mas, segundo ela, o Instituto do Patrimônio não deixará de acompanhar com lentes de aumento como anda o processo de preservação histórica na cidade mineira. “Tenho medo que as Secretarias de Obras sejam mais fortes do que as de Cultura, pois elas manejam os recursos. Se não for bem orquestrada, a Cultura fica para trás. O que temos que fazer é dar um crédito à prefeitura e torcer. Mas estaremos atentos para que a administração municipal não abandone a preservação do patrimônio da cidade”, afirma.
Contrário à reformulação, o ex-diretor do Iphan em Ouro Preto, Benedito Tadeu, acredita que a separação das secretarias pode acelerar ainda mais a ocupação desordenada nas encostas da cidade. “Não temos mais lugar para uma expansão desordenada e autodestrutiva da cidade, já que vai contrariar além do tombamento do Iphan, as recomendações da Unesco de 2003, o Estatuto da Cidade e a própria Constituição Federal de 1988”, avalia o arquiteto.
Para evitar esse crescimento desenfreado, a Prefeitura de Ouro Preto afirmou que estuda deslocar a população que se fixou em moradias irregulares nas encostas e sítios arqueológicos da cidade. A ideia é transportá-los para bairros próximos à Estrada do Contorno, Cachoeira do Campo e Mariana, a serem construídos. Por enquanto, a cidade segue na expectativa.
 
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